... Iemanjá é um orixá feminino, divindade africana, do Candomblé e da Umbanda. Padroeira dos pescadores, é senhora do destino dos que entram no mar. Reverenciada por muitos na passagem do ano novo e em outras tantas datas, conforme costumes diversos, é no dia 2 de fevereiro que acontece sua grande festa, em Salvador na Bahia, na praia do Rio Vermelho...
Antonio Pereira Apon.

O Poseidon dos gregos, Netuno dos romanos e o Aegir dos nórdicos que nos desculpem. Mas, o empoderamento feminino, invadiu até mesmo o “divinal”. Assim, ao imaginar-se entidades dominantes das águas, são elas, as “minas”, que assomam à nossa mente: Iemanjá, Iara, Afrodite, Sereias... Que povoam o imaginário popular. Segundo Carl Gustav Jung e seus arquétipos psicanalíticos, todos somos susceptíveis à padrões que se vão repetindo, ficando armazenados no inconsciente coletivo, passados de geração em geração. Conforme o instinto, sentimentos e comportamentos de cada qual, tais padrões eclodem. Daí, podemos inferir as similitudes entre as “Rainhas do Mar”. Ainda que oriundas de culturas tão diversas, carregam o mesmo simbolismo feminino, representado na singular faceta de cada mulher. A sensualidade e a maternidade, a água e o ventre feminal, como forças geradoras da vida e o paradoxal perigo das correntezas, intempéries aquáticas, beleza e risco, à feição das águas e humores das suas “deusas”.
Já ouviu falar no “canto de sereia”? As mulheres peixe, são figurinha fácil nas mais diversas culturas, sendo a versão mais disseminada do mito, a dos gregos, segundo os quais, a princípio, existiam dois seres distintos. As sereias, metade peixe, metade mulher, e as sirenas, mulheres-pássaro que atraíam os navegantes com o seu canto hipnotizante para a morte, atirados entre pedras. Lá por volta da Idade Média, sereias e sirenas, se confundiram num só ser. Companheiras de Perséfone, antes dela ser conduzida ao Reino de Hades, o mundo dos mortos, o canto das sereias, passou a ser tratado como canto fúnebre, anunciação da morte. Na Odisseia de Homero, durante a viagem à Itaca, a nau atravessou o domínio das míticas moçoilas. A tripulação tapou os ouvidos com cera de abelha para conseguir escapar aos encantos do entorpecente canto delas. Com Odisseu amarrado ao mastro, conseguiram manter o curso e impedir o eminente desastre.
Padroeira de Roma, Afrodite, impediu que soldados inimigos invadissem a cidade, usando os seus poderes para bloquear o caminho com águas. Já para os gregos, segundo Hesíodo, Afrodite emergiu das espumas do mar em meio ao confronto entre Cronos e Urano para dominar a Terra. Quando Cronos cortou os órgãos genitais de Urano, jogando-os ao mar, surgiu uma espuma branca e dessa, uma formosa mulher, Afrodite. Daí ela ser venerada por marinheiros da antiga Grécia, os quais rogavam-lhe proteção sempre que se aventuravam em novas viagens.
Por aqui, a mitologia amazônica, nos conta que Iara, valorosa guerreira, afogou-se no encontro entre o rio Negro e o Solimões, sendo transformada pelos peixes e o luar, numa sereia, a Senhora das Águas, com os cabelos negros, olhos esverdeados, corpo metade mulher e metade peixe, que com seu canto mágico, seduz os homens e os leva para o fundo do rio. Os poucos que escapam da morte, enlouquecem e carecem ser tratados pelos pajés.
Um dos maiores ícones do sincretismo brasileiro, a Iemanjá hodierna é fruto de um caldo de culturas. Originária do povo Egba, na Nigéria, tratada por Yemojá, era cultuada como a deusa dos rios, da fertilidade e da maternidade. Filha de Olokun, seu nome, Iemanjá, quer dizer “mãe cujos filhos são como peixes”. Mãe-d'água para Iorubatanos no Daomé. transmuta de orixá fluvial na África, para marítimo no norte/nordeste brasileiro. Aqui, ela ganha diferentes nomes: Dandalunda, Inaé, Ísis, Marabô, Mucunã, Princesa de Aiocá, Princesa do Mar, Rainha do Mar, Sereia do Mar, Janaína (remetendo à Iara, versão guarani do seu nome), “Afrodite brasileira” (aludindo à sua proteção aos apaixonados)...